31 julho, 2008

Eduardo Beny


PETRÓLEO CARO

Ao atingir, no início deste ano, a marca psicológica de 100 dólar o barril, o mercado internacional está ciente de que iniciou um novo ciclo em matéria de petróleo, consubstanciado sobretudo numa outra realidade: entramos na era do petróleo caro.
Independentemente da projecção de alguns analistas que apontam, como é evidente, oscilações constantes dos preços, podendo o preço do barril voltar a descer para a marca dos 70 ou 80 dólares o barril, o certo é que tal descida, a acontecer, dificilmente permanecerá por longo período, sendo, por isso, a subida dos gráficos para próximo ou acima dos 100 dólares a variável que veio para ficar, por razões mais que óbvias.
É preciso ter em conta que o preço do barril do petróleo está indexado não em relação à oferta mas, sim, ao volume das reservas que devem diminuir ou aumentar menos que a procura.
Dez anos atrás projectava-se que a barreira atingida, a 2 de Janeiro deste ano, poderia acontecer a qualquer momento. Isto tendo em linha de consideração um determinado conjunto de factores objectivos que estão relacionados com a própria conjuntura política internacional que caracterizam a actual tão difusa ordem mundial, a emergência de novos e relevantes actores internacionais, as previsões do aumento do consumo mundial, em função das necessidades sobretudo da China e da Índia, não deixando de pesar na balança a instabilidade do Médio Oriente, marcada pela guerra do Golfo Pérsico, etc.
A marca dos 100 dólares certamente foi devida a um conjunto de factores:
Factores conjunturais que mais têm a ver com a desvalorização do dólar e as ameças que pesam sobre a moeda americana (as actuais oscilações em dólares significam 10 anos de estagnação da economia americana); questões de índole geopolítica que pintam o quadro político da Nigéria (caracterizado pela permanente instabilidade da região do Delta do Níger, através de actos de guerrilha contra interesses petrolíferos), da Venezuela e do Iraque; factores de natureza climatérica, tendo, no final do ano até o presente estar a verificar-se um inverno bastante rigoroso no hemisfério norte (Estados Unidos e Canadá, com um consumo de petróleo no global na ordem dos 40%), portanto, uma situação sazonal em que se verifica um maior consumo emergético, mas que em consequência reduz também a produção e afecta o transporte de energia hidroeléctrica.
Por outro lado, importa considerar os factores de ordem estrutural. Não estava previsto o aumento do consumo asiático puxado pelo aumento do PIB médio de 10% ano, com o aumento global de 2% ano do consumo (previsão da Agência Internacional de Energia), a capacidade de produção não utilizada (a volta de 2 milhões de barris/dia há 3 anos) estava ultrapassada pelo aumento do consumo (cerca de 3 milhões de barris/dia). Isto, simplesmente quer dizer que há pouca margem de segurança em caso de catástrofe: geopolítica ou natural.
Finalmente, há um outro factor importante a reter: a especulação. O tipo de especulação que temos em consideração não é a especulação praticada com alguém a vender o barril a 80 e o outro, por exemplo, a 85. Não! É a especulação feita pelos próprios Estados ou governos que manipulam a realidade do volume das suas reservas de petróleo, de modo a tirarem benefícios em função da volatilidade dos preços, anunciando números que, muitas vezes, não correspondem a realidade, mas que não deixam de agitar o mercado “mexendo”, asim, com o próprio sistema petrolífero internacional. Por exemplo, quando os o preços de petróleo voltaram a subir semanas atrás, após três sessões em queda, tal situação foi devida, também, pelo facto do Departamento de Energia dos Estados Unidos ter anunciado que as reservas norteamericanas aumentaram na ordem dos 4,26 milhões de barris, quando o mercado esperava, apenas, um acréscimo na ordem de 1,25 milhões de barris, o que dá perfeitamente a ideia do quão é importante a questão das reservas na flutuação dos preços de petróleo.
De todo este conjunto de factores, em nosso entendimento os de índole geopolítica que vão sendo apontados como estando na razão do disparo dos preços em alta suscitam menos consistência na argumentação da questão, chegando mesmo ao ponto de determinados analistas incluirem (pensamos despropositadamente) a situação do Paquistão, no conjunto das causas. Porquê? Porque as alterações em termos do “status-quo” geopolítico que pudessem efectivamente contribuir para uma alteração substancial dos preços do crude não são significativas. Na Nigéria o quadro dos focos de instabilidade mantêm-se, mais ou menos, estáveis (se assim podemos dizer), assim como, no Iraque. Na Venezuela também não aconteceu nada de monta e não vejo o que está a acontecer no Paquistão, mesmo com a morte de Benazir Bhuto, como factor a relevar.
Devemos estar mais atentos com o que se está a passar com o mercado imobiliário norteamericano, com a descida das taxas de juro, de modo a estimular os invetimentos, com o objectivo de amortecer os efeitos da actual recepção económica dos EUA, e às manipulações das reservas comprovadas de petróleo, com o consumo asiático e rezarmos para que não haja uma catástrofe geopolítica ou natural (que baste o inverno intenso no hemisfério norte), que venha a obrigar “mexer” nos actuais níveis de produção. Aliás, os produtores de crude “bom” (entre os quais Angola) não estão muito interessados em aumentar a sua produção, porque devem fazer “durar” as suas reservas.
De resto, o que está a acontecer com o sistema petrolífero internacional, constantemente agitado e bastante nervoso, faz a nossa certeza: a era do petróleo barato (se alguma vez o foi) acabou!

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